

O novo Governo de Macau, liderado por Ho Iat Seng, tomou hoje posse perante o Presidente da República Popular da China, Xi Jinping.
Trata-se do quinto Governo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), que celebra hoje o seu 20.º aniversário, depois de em 20 de dezembro DE 1999 o território ter voltado à tutela da China, após mais de 400 anos de administração portuguesa.
Depois de Ho Iat Seng prestar juramento perante Xi Jinping, pouco depois das 10:00 (03:00 no Luxemburgo), foi a vez da tomada de posse dos secretários que integram o novo Executivo.
Do Governo anterior, do chefe do Executivo que hoje terminou funções, Fernando Chui Sai On, continuam nas mesmas pastas, Wong Sio Chak, como secretário para a Segurança, e Raimundo Arrais do Rosário, como secretário para os Transportes e Obras Públicas.
Como secretário para a Administração e Justiça tomou posse André Cheong Weng Chon, que transita do Comissariado Contra a Corrupção (CCAC), para secretário para a Economia e Finanças foi escolhido Lei Wai Nong, ex-vice-presidente do Instituto para os Assuntos Municipais (antigo Leal Senado), enquanto Ao Ieong U, que exercia as funções de diretora dos Serviços de Identificação, ocupa desde hoje o cargo de secretária para os Assuntos Sociais e Cultura.
Tomaram ainda posse o comissário contra a Corrupção, Chan Tsz King, o comissário da Auditoria, Ho Veng On, que se mantém nas funções, o diretor dos Serviços de Alfândega, Vong Man Chong, que era subdiretor destes serviços, e o procurador do Ministério Público, Ip Son Sang, que se mantém no cargo.
Na cerimónia da tomada de posse estiveram presentes os anteriores chefes do Governo a RAEM, Edmund Ho e Fernando Chui Sai On, que exerceram ambos dois mandatos no cargo, e a chefe do Executivo de Hong Kong, Carrie Lam.
A transferência da administração de Macau de Lisboa para Pequim, em 1999, foi feita sob a fórmula ‘um país, dois sistemas’, que garante ao território um elevado grau de autonomia, a nível executivo, legislativo e judiciário.
A fórmula aplica-se também à outra região da China com esta administração especial, Hong Kong, onde os últimos seis meses têm sido marcados por protestos o poder político.
Futuro passa por patriotismo, integração e cooperação sino-lusófona
O novo chefe do Governo de Macau, Ho Iat Seng, afirmou hoje, na sua tomada de posse perante o Presidente chinês, que o futuro de Macau passa por reforçar o patriotismo, a integração nacional e a cooperação sino-lusófona.
No seu primeiro discurso na qualidade de chefe do Executivo, Ho Iat Seng sublinhou os “sólidos alicerces de desenvolvimento” e os “progressos notáveis” de Macau assegurados pelos dois antecessores nos últimos 20 anos, com a ajuda do Governo central e sustentou que o caminho a seguir agora também tem de incluir a diversificação da indústria turística, o programa internacional de Pequim “Uma faixa, uma rota” e o projeto regional de construção de uma metrópole mundial que vai juntar o território, Hong Kong e nove cidades da província chinesa de Guangdong.

Por outro lado, o ex-presidente da Assembleia Legislativa (AL) prometeu “acelerar o planeamento urbano, a construção de habitações públicas, melhorar o trânsito, reforçar a proteção ambiental e impulsionar o desenvolvimento da renovação urbana e também da cidade inteligente”.
O novo chefe do Governo destacou o facto de Macau possuir “vantagens únicas” pelo seu “multiculturalismo”, como ponte entre o oriente e o ocidente e entre a China e os países de língua portuguesa, um posicionamento que pode ser potenciado, sustentou, pelo seu novo Governo que hoje tomou posse, e pelos vários setores da sociedade, sempre com o apoio de Pequim, sob o princípio “um país, dois sistemas”.
“Iremos reforçar os cursos de formação sobre a situação nacional aos funcionários públicos, no sentido de elevar a sua consciência nacional” e “reforçar a o patriotismo dos jovens” para “assegurar que o amor à pátria e o princípio ‘Um país, dois sistemas’ sejam transmitidos de geração em geração”, acrescentou.
Ho Iat seng, o empresário pró-Pequim que governa Macau desde hoje
O novo chefe do Executivo de Macau, Ho Iat Seng, nascido em Macau em 1957, é um empresário considerado pró-Pequim que se estreou como deputado em 2009 e chegou à presidência da Assembleia Legislativa da região em 2013.
Ho Iat Seng ganhou alguma visibilidade a partir de 2013, quando foi eleito presidente da Assembleia Legislativa (AL) de Macau, mas é membro há 20 anos do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional da China, o “órgão supremo do poder de Estado”, à luz da Constituição chinesa.
O agora chefe do Governo da região Administrativa Especial de Macau (RAEM) era, ainda enquanto presidia à Assembleia Legislativa, administrador e gerente-geral da Sociedade Industrial Ho Tin S.A.R.L., presidente do conselho de administração da Companhia de Investimento e Desenvolvimento Ho Tin, Limitada e administrador e gerente-geral da Fábrica de Artigos de Plástico Hip Va.
Ho Iat Seng era ainda vice-presidente da Associação Comercial de Macau e é o presidente vitalício da Associação Industrial de Macau.
O novo líder da RAEM recebeu a medalha de Mérito Industrial e Comercial, entregue pelo o último governador de Macau (1999), Rocha Vieira, a medalha de Mérito Industrial e Comercial (2001) e a medalha de Honra Lótus de Ouro (2009), ambas atribuídas pelo Governo da RAEM.
Cinzento, pró-Pequim, sem experiência governativa e sem pensamento conhecido sobre Macau: foi este o perfil que personalidades do território traçaram de Ho Iat Seng em abril, quando anunciou a sua candidatura a chefe do Executivo da região.
Já membros da comissão eleitoral que o elegeu, ouvidos pela Lusa em agosto, atribuíram-lhe um perfil mais ativo do que o de Chui Sai On, a quem sucedeu hoje, sensato, interventivo, conhecedor dos desígnios nacionais e sensível à comunidade portuguesa.
Ho Iat Seng é “relativamente discreto, cinzento, extremamente cauteloso, não parece ter ideias próprias: terá as indicações que a China lhe der”, tentou resumir à Lusa o presidente do Fórum Luso-Asiático, Arnaldo Gonçalves, em abril deste ano.
O professor do Instituto Politécnico de Macau, doutorado em Ciência Política e antigo assessor dos ex-governadores de Macau Carlos Melancia e Vasco Rocha Vieira, disse desconhecer o percurso académico de Ho Iat Seng e ter apenas uma vaga ideia da sua atividade enquanto empresário.
Contudo, sublinhou, o fundamental é perceber porque demorou tanto tempo a anunciar a candidatura: “Parte da elite de Macau entendia que não tinha o perfil adequado” e terá sido necessário negociar o nome dos novos secretários do Governo “que agradassem às famílias mais importantes de Macau”.

O único deputado português na AL e conselheiro das comunidades portuguesas, José Pereira Coutinho, realçou, na mesma altura, “a sua inexperiência governativa” e considerou que o peso político enquanto membro do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional da China e o apoio do Governo central da China eram “a sua mais-valia” para se candidatar a chefe do Executivo.
Ho Iat Seng foi o único candidato ao cargo de que tomou hoje posse e foi eleito, em agosto, depois de ter recebido o aval de Pequim, com 392 votos a favor, sete em branco e um nulo de uma comissão eleitoral composta por 400 membros.
“Estamos perante uma pessoa com uma capacidade de intervenção muito superior” à de Chui Sai On, disse em agosto à Lusa o membro da comissão eleitoral e presidente da Associação dos Macaenses (ADM), Miguel de Senna Fernandes, que vê na personalidade sensata, dinâmica e interventiva de Ho Iat Seng “bons sinais” para desempenhar o cargo, restando agora esperar que “estas boas impressões se confirmem na prática”.
Também o arquiteto Carlos Marreiros, um dos 400 membros da comissão eleitoral, disse ter expetativas positivas e considerou que Ho Iat Seng tem uma personalidade mais ativa do que aquela demonstrada por Fernando Chui Sai On nos últimos 10 anos.
Ambos sublinharam as ações e as palavras que o ex-presidente da AL de Macau teve para com a comunidade portuguesa.
“Teve sensibilidade suficiente para dizer sim à comunidade portuguesa e isso é muito importante”, afirmou Miguel de Senna Fernandes.
Para o ex-deputado Leonel Alves, que esteve na AL 33 anos, tanto durante a administração portuguesa como na chinesa, o facto de Ho Iat Seng ter pertencido durante 20 anos ao Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional da China dá-lhe um “profundo conhecimento de como funciona o Estado chinês”.
Por isso, sublinhou, entende a necessidade da interação com as regiões vizinhas de Macau que integram a Grande Baía, uma metrópole mundial que Pequim está a criar e que integra Macau, numa região com mais habitantes do que nações como França, Reino Unido ou Itália.
Para Leonel Alves, Ho Iat Seng está em “sintonia com as grandes políticas e com os grandes desígnios nacionais” que são necessários para a concretização deste plano de Pequim, desvalorizando o facto de Ho nunca ter tido qualquer experiência governativa.
“Assim não tem vícios”, frisou.
Deputados pró-democracia fora da tomada de posse do Governo e de eventos com Xi Jinping
Pelo menos três deputados pró-democracia da Assembleia Legislativa (AL) de Macau ficaram de fora da tomada de posse do novo Governo e de eventos com a presença do Presidente chinês no âmbito do 20.º aniversário da administração chinesa.
Ng Kuok Cheong, Au Kam San e Sulu Sou, aparentemente por razões distintas, não compreceram no dia em que se celebram os 20 anos da transferência de Macau para a China e cujo programa incluía o Içar da Bandeira, a tomada de posse do chefe do Executivo e ex-presidente da Assembleia Legislativa, Ho Iat Seng, e uma receção na Torre Macau no âmbito das comemorações.
“Tenho a certeza de que não recebi nenhum convite para o 20.º aniversário do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau [RAEM], inclusive a cerimónia de tomada de posse do novo Governo”, disse à Lusa Au Kam San.
O deputado disse ainda não ter ficado surpreendido e estar “habituado a não ser convidado”. E acrescentou: “Além disso, mesmo que tivesse sido convidado, não estaria interessado em participar neste tipo de eventos sem qualquer significado”.
Em resposta à Lusa, Ng Kuok Cheong afirmou ter recebido convites para as cerimónias, mas que preferiu não participar nas mesmas. “Sabia que não seria bem-vindo a 100% e por isso não vou estar presente”, explicou.

Já Sulu Sou, em declarações à Rádio Macau, garantiu ter recebido convites apenas para as “atividades em que o Presiente Xi Jinping não vai participar”, algo que considerou “estranho”.
Ainda este ano, estes três deputados pró-democracia de Macau lembraram na AL os 30 anos do massacre de Tiananmen, na Assembleia Legislativa de Macau, um tema tabu para o Governo chinês, e pediram a Pequim para não “fugir à verdade histórica”, considerando que a sociedade exige “verdade, indemnização e responsabilização”.
De resto, o destino de António Ng Kuok Cheong ficou traçado quando se juntou aos protestos em Macau contra o massacre de Tiananmen, em Pequim, a 4 de Junho de 1989. Foi rapidamente ‘corrido’ do Banco da China e em 1992 foi eleito para a AL, onde continua até hoje.
Sulu Sou, que é vice-presidente da Associação Novo Macau, tem feito da defesa do sufrágio universal em Macau a sua maior bandeira. Ng Kuok Cheong e Au Kam Sa são fundadores da associação, que se tem batido por reformas democráticas no território.
No final de 2018, Au Kam San ficou também ligado a um conflito com as autoridades locais. A Polícia Judiciária enviou mesmo uma carta ao deputado a exigir um pedido de desculpas, no prazo de dez dias, no seguimento de declarações em que o deputado insinuou que as autoridades estavam a realizar escutas ilegais.
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